O governo decidiu jogar para o consumidor o
pagamento das indenizações bilionárias das transmissoras de energia. A medida
sai após quatro anos e meio de espera, depois de a União ter esvaziado o caixa
dos fundos setoriais e da recusa do Tesouro Nacional em pagar um volume de
recursos que deve atingir R$ 62,2 bilhões. Com essa solução, o governo retoma
exatamente a prática que era feita antes da edição da polêmica Medida
Provisória 579/2012, programa lançado pela ex-presidente Dilma Rousseff, por
meio da qual a conta de luz foi reduzida em 20%. Agora, a tarifa volta a ter
uma parcela referente à remuneração das empresas por investimentos já realizados,
que havia sido retirada em 2013.
O pagamento vai entrar na tarifa de energia do
consumidor a partir de julho, diluído em oito anos. O impacto, neste ano, será
de 7,17%, em média, de acordo com a Agência Nacional de Energia Elétrica
(Aneel), variando de 1,13% a 11,45%. Isso não significa que as contas vão subir
nessa magnitude, pois a transmissão é apenas um de vários itens que compõem as
tarifas, que inclui custos de geração, distribuição, subsídios e impostos.
Esse custo, porém, diminui o potencial de queda que
as tarifas de energia teriam neste ano, após terem subido 51% em 2015 e recuado
apenas 10,66% em 2016, segundo dados da inflação medida pelo IPCA do IBGE.
Um exemplo disso é a tarifa da Energisa Borborema,
que atende municípios da Paraíba. Os consumidores da região tiveram um aumento
de 0,43% na conta de luz em janeiro deste ano. Sem a indenização das
transmissoras, a tarifa teria caído 2,37%.
Atraso
O pagamento de indenizações às transmissoras
deveria ter começado em 2013 e seria arcado pelo Tesouro Nacional. As
companhias aceitaram prorrogar suas concessões por 30 anos, de forma
antecipada. Isso viabilizou a redução da conta de luz, anunciada pela
ex-presidente Dilma Rousseff, que fez as tarifas caírem 20%, em média.
Na época, o governo aceitou pagar indenizações para
as empresas que detinham usinas hidrelétricas antigas e que renovaram os
contratos com receitas mais baixas. Em seguida, devido a um período de seca e
de aumento do consumo que quase levou a um racionamento, o custo da energia
aumentou. No entanto, o governo decidiu represar essa conta em meio ao período
eleitoral.
Essas políticas consumiram todo o caixa acumulado
dos fundos setoriais, que somava cerca de R$ 15 bilhões, exigiram emissões,
aportes e empréstimos do Tesouro, no valor de R$ 14 bilhões, e um financiamento
bancário de R$ 21,176 bilhões, que, devido aos juros, chegará a R$ 35,417
bilhões.
Ainda faltava, porém, definir uma solução para os
investimentos realizados pelas companhias que investiram em linhas de
transmissão e subestações, resolvido somente neste ano. O problema desse atraso
é que as empresas receberão todo o dinheiro com juros. As nove concessionárias
terão direito a receber R$ 62,2 bilhões nos próximos oito anos. Desses, R$
35,217 bilhões, mais da metade do dinheiro, correspondem a juros.
Justiça
As turbulências no setor elétrico levaram empresas
e associações a entrarem na Justiça nos últimos quatro anos. No caso das
indenizações definidas na terça-feira, não deve ser diferente. O presidente
executivo da Associação Brasileira de Grandes Consumidores (Abrace), Edvaldo
Alves de Santana, avalia que as indenizações são indevidas e ilegais e não
descarta esse caminho.
Para as indústrias que fazem parte da associação, o
aumento será maior e deve atingir 25%, em média, considerando o custo da
energia e da transmissão. "Parece que estão nos induzindo a ir à
Justiça", afirmou.
Outros setores da indústria também devem se
mobilizar contra o reajuste. O superintendente da Associação Técnica Brasileira
das Indústrias Automáticas de Vidro (Abividro), Lucien Belmonte, disse que a
entidade está pronta para entrar na Justiça contra a proposta. "Estamos
preparados para contestar essa conta. Não vamos incorporar essa história de
aumento de conta de luz de novo", afirmou.
O presidente da Associação Brasileira das Empresas
de Transmissão (Abrate), Mário Miranda, defendeu a proposta e disse que as
empresas estão finalmente recebendo os valores a que têm direito. Ele mencionou
que o atraso no pagamento prejudicou o resultado dos leilões de transmissão nos
últimos anos.
O diretor-geral da Aneel, Romeu Rufino, disse que o
pagamento das indenizações é uma decisão do governo e que cabe à agência apenas
regulamentar essa política. Segundo ele, não é possível rever essa norma, mas,
se forem encontrados erros nos cálculos de indenização, eles serão corrigidos.
"Não temos compromisso com erro", afirmou. Ele disse que a agência
estará preparada caso as associações e empresas recorram ao Judiciário.
Com informações O POVO ONLINE