Dentre todas as incalculáveis consequências do
câncer à vida de quem o enfrenta, estão as marcas na autoestima. Em relação às
mulheres, principalmente às vítimas do carcinoma mamário, a questão é ainda
mais delicada: em muitos casos, o bem-estar emocional é removido
cirurgicamente, junto com uma parte do corpo.
Para minimizar os prejuízos à saúde
e reparar, dentro do possível, as formas do corpo de mulheres que realizam a
mastectomia (cirurgia de retirada da mama), foi sancionada pelo Governo Federal
uma lei que garante a reconstrução dos dois seios, para garantir a simetria
entre eles. O procedimento deve ser feito independentemente de apenas uma mama
ter sido retirada em consequência da doença.
Reconstrução
A nova lei foi assinada em
solenidade com a bancada feminina do Congresso Nacional, no último dia 19 de
dezembro. Para a supervisora do Núcleo de Defesa da Saúde (Nudesa) da
Defensoria Pública Geral do Ceará, Karine Matos, a nova garantia de direito
assegurada às mulheres é de grande importância. "É fundamental pela
representatividade de a mulher se sentir feminina. Essa conscientização da
reconstituição deve ser feita desde o momento do diagnóstico até a saída da
mesa de cirurgia, com as mamas iguais", frisa.
Segundo Karine, a Defensoria Pública
"ficará atenta" para assegurar judicialmente os direitos das mulheres
assistidas neste caso. "Toda política pública que beneficia a mulher tem
que ser devidamente cumprida, porque vai além da estética. É sobre o bem-estar
delas", pontua. Desde 2013, a Lei 12.802 obriga o Sistema Único de Saúde
(SUS) a fazer a cirurgia plástica reparadora da mama logo em seguida à retirada
do câncer, quando houver condições técnicas e médicas.
Preparo
Apesar da obrigatoriedade, cerca de
70% das mulheres operadas não realizam a reconstituição, como estima o
presidente Regional no Ceará da Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM),
Francisco Pimentel, afirmando que a quantidade "nem de longe é um número
ideal". "(A Lei) é um avanço, mas o sistema público de saúde
necessita preparar sua infraestrutura. Senão, na prática, a nova lei não vai
mudar nada".
"É preciso ter preparados o
material e o humano, os equipamentos e o pessoal. A Sociedade (de Mastologia)
fez, nos últimos anos, inclusive cursos para preparar as equipes. Então, é
possível que com a nossa iniciativa e com a lei aumente o número de mulheres
que se submetam à reconstrução", projeta Francisco.
Complicações
Somente as mulheres consideradas
"tardias", que voltam tempos depois da mastectomia para solicitar a
reconstituição, e que tenham cardiopatia ou sejam idosas não podem se submeter
ao procedimento, devido ao tempo da cirurgia.
De acordo com Dr. Pimentel, a
complicação acontece entre 5% a 10% dos casos, "em qualquer lugar do
mundo". "As mulheres ainda precisam se submeter à radioterapia contra
a reincidência. Isso danifica o tecido e sua taxa de firmeza", explica.
Francisco trabalha no Hospital Geral de Fortaleza (HGF), referência na área, e
garante que o procedimento é realizado em todas as pacientes.
Diagnosticada com câncer de mama,
Antonia dos Santos foi atendida no HGF, em 2012, e conseguiu a reconstituição
dos dois seios, mesmo antes da alteração da lei que garante esse direito.
"Nem imagino meu corpo se não
tivesse feito. Só com as duas mamas do mesmo tamanho eu consigo me enxergar bem
no espelho e ter autoestima", afirma.